JB, 29 anos, masculino, natural do Piauí, procedente de São Paulo (SP).
  Paciente há 4 dias evoluiu com quadro súbito de dispnéia aos moderados esforços, dor torácica ventilatório dependente e febre (38,5 C).
  Apresentava anemia falciforme diagnosticada há 15 anos, já tendo apresentado há cerca de 5 anos quadro semelhante, com necessidade de suporte ventilatório. Há 5 meses parou de usar medicação (hidroxiuréia e ácido fólico) por conta própria.
  Referia irmão com anemia.
  Negava etilismo e tabagismo.
  Ao exame físico encontrava-se hipocorado (++/4), ictérico (++/4) e febril
  FC=112 bpm
  PA=120x78 mmHg
  FR=32 irpm
  Ausculta pulmonar com estertores crepitantes em base e terço médio direito.
  Saturação em ar ambiente 83%.
  Os exames complementares iniciais mostraram:
  Hb = 5 mg/dl
  GB = 12.300 /mm3 (Bt=8% - Seg=72%)
  Plaquetas = 185.000 /mm3
  Bilirrubinas = 6,4 mg/dl (direta = 1,6 mg/dl - indireta = 4,8 mg/dl)
  DHL 756 u/dl
  Gasometria:PH 7,35;PaO2 60 mmHg ;PaCO2 22 mmHg ; HCO3 16 mEq/l; SaO2 90% 
  

  Qual a hipótese diagnóstica?
   
  *Resposta:
Hipóteses diagnósticas:
Diagnóstico sindrômico
    * Síndrome torácica aguda
Hipóteses para diagnóstico etiológico
    * Pneumonia
    * Embolia pulmonar
Evolução:
Em função do quadro clínico e dos exames iniciais, as seguintes medidas terapêuticas foram iniciadas:
    * Antibioticoterapia - ceftriaxone + claritromicina
    * Hemotransfusão
    * Hidratação venosa
    * Oxigenoterapia
    * Controle álgico
    * Fisioterapia respiratória
Foram colhidas hemoculturas e realizado o ecocardiograma, que mostrou discreta hipertrofia ventricular direita, com refluxo tricúspide mínimo e estimativa da pressão arterial pulmonar média de 34 mmHg. O paciente apesentava outro ecocardiograma, realizado há 3 anos que já mostrava a discreta hipretrofia de ventrículo direito e pressão arterial pulmonar média estimada em 40 mmHg.
Foi isolado na hemocultura Streptococcus pneumoniae, confirmando o diagnóstico de pneumonia como causa da síndrome torácica aguda.
O tratamento antimicrobiano foi mantido por 14 dias, com o paciente apresentando melhora clínica e recebendo alta em boas condições.
Comentários:
    Síndrome torácica aguda
    A síndrome torácica aguda (STA) é definida pelo aparecimento de febre e sintomas respiratórios, como tosse, dor torácica ou dispnéia, acompanhados por infiltrado pulmonar recente. É uma complicação freqüente, sendo a maior causa de morte e a segunda causa de hospitalização em pacientes com anemia falciforme.
    As principais causas de síndrome torácica aguda são:
        *          Infecção - o principal agente ainda é o Streptococcus pneumonia, embora as participações de Mycoplasma pneumoniae e Clamydia pneumoniae também sejam importantes.
        *          Infarto pulmonar
        *          Embolia da medula óssea (mais comum)
        *          Tromboembolia (menos comum)
        *          Lesão pulmonar - quadro semelhante à SARA, porém de evolução mais benigna, tendo como causa mais provável a embolia gordurosa a partir de infarto ósseo.
        *          Atelectasias
        *          Edema pulmonar - pode ser favorecido pela hiper-hidratação, comumente realizada nesses pacientes.
    O quadro clínico pode ser variável, por vezes evoluindo para insuficiência respiratória aguda e necessidade de suporte ventilatório. No exame físico podem ser notadas febre (mais comum em crianças), palidez, icterícia e taquipnéia. A ausculta pulmonar é alterada em dois terços dos pacientes, podendo ser encontrados estertores crepitantes, roncos e/ou sibilos, e normal e um terço dos pacientes.
    No radiograma de tórax pode ser analisada a extensão do processo, sendo que o acometimento de mais de 3 lobos demonstra maior gravidade. Os lobos inferiores são os mais comumente acometidos, sobretudo em adultos. O principal achado é o de consolidação, enquanto o derrame pleural, quando presente, é normalmente pequeno.
    No hemograma pode se observar queda nos níveis de hemoglobina, leucocitose e plaquetopenia, a qual, se inferior a 190.000/mm3, denota gravidade. A gasometria arterial pode revelar hipoxemia e o ecocardiograma sinais de hipertensão pulmonar, normalmente secundária à trombose in situ, à hipoxemia, à embolia gordurosa, entre outras causas. A broncoscopia pode ser útil na coleta de material para cultura e para citologia diferencial (demonstrando a presença de macrófagos xantomizados).
    O tratamento da síndrome torácica aguda inclui:
        *          hidratação - deve consistir apenas em cerca de uma e meia vez as necessidades basais, devido ao risco de piora do edema pulmonar.
        *          oxigenoterapia - deve ser utilizada com a PaO2 < 70 mmHg ou SaO2 < 92%. Lembramos que a monitorização por oxímetro de pulso para mensuração da PaO2 é mais fidedigna que a gasométrica, nesses casos, devido à presença da hemoglobina S.
        *          transfusão sanguínea - melhora a oxigenação e diminui o nível de hemoglobina S. Deve-se ter cautela quanto ao risco de sobrecarga volumétrica, sensibilização e risco de contaminação por patógenos transmitidos pelo sangue.
        *          controle da dor e espirometria de incentivo - utilizados para prevenção de hipoventilação e atelectasias.
        *          antibioticoterapia - usado empiricamente em crianças, nas quais a etiologia infecciosa é mais comum. O uso rotineiro em adultos não é recomendado, devendo ser indicado nos quadros em que há suspeita de pneumonia. Deve ser utilizado esquema de amplo espectro (ex: cefalosporina de 3ª geração associada à macrolídeo), lembrando a incidência anteriormente subestimada de Mycoplasma sp e Clamydia sp.
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